quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

EPIGRAMA




EPIGRAMA AO POETA SILVÉRIO DUQUE

A arte, em seu ímpeto,

torna-se ventura.

Assim o poeta, em seu ofício,

de palavras perdura.



terça-feira, 27 de dezembro de 2011

EPIGRAMA




EPIGRAMA AO POETA ROMMEL WERNECK


Há uma luz para poucos,

como o trigo em colheita escassa.

Mas sua essência perdura

- Divina Graça -

aos eleitos de obra rara.






segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

EPIGRAMA



EPIGRAMA





Amor, raro,

de ilusões não se vende,

apenas quem consente

o valor de quem mente.







EPIGRAMA




EPIGRAMA




Não perde o amor o préstimo da vida,

senão com ínfimo amor quem lida.



EMÍLIO MOURA: POEMA





NOTURNO DE OURO PRETO I




Guardas o ar das noites mais antigas,

ilumina-te a luz da eternidade.

Calam-te os sinos. Baixa a névoa. E ligas

a tua alma sonâmbula à que invade



a paisagem dormida. Teus sobrados,

casas, igrejas, paços, velharias

morrem da morte a sós dos afogados.

Quem te falou da morte que terias?



Que ilhas de tempo, que áreas de abandono,

que ignotas solidões geram teu sono!

Que preces te adormecem? Sim, que preces



ergues ao ar para que nada importe,

nada da vida que desaparece,

tanto sabes da morte antes da morte?




EMÍLIO MOURA: POEMA




OURO PRETO I




Que frio!

A neblina rói a paisagem.

Sinto o tempo parado em cada pedra que piso.

O passado me envolve, pairo sobre as igrejas e assisto à ressurreição dos mortos.



Sou apenas memória.

MURILO MENDES: AFORISMOS




A poesia é a realidade; a imaginação, seu vestíbulo.




A plenitude poética opera o refinamento e a transfiguração da condição humana.



A poesia não pode nem deve ser um luxo para alguns iniciados: é o pão cotidiano de todos, uma aventura simples e grandiosa do espírito.



O verdadeiro poeta é conjuntamente um ser de circunstância, e eterno.



O olhar do poeta é vastíssimo: só ele percebe os inumeráveis crimes contra a Poesia.



Raramente me lembro que sou escritor; nunca me esqueço que sou poeta.



Não existe nada mais dentro de um conceito lógico, e menos digno de surpresa, que o desprezo do rico pelo poeta.



Haverá algum grande espírito que não seja clássico?



A escola futura deverá ser a base poética. Senão, servirá à burocracia e à guerra.



Através dos séculos o poeta é encarregado, não só de revelar aos outros, mas de viver praticamente no seu espírito e no seu sangue, a vocação transcendente do homem.



Sempre, em todos os tempos, a poesia corrigiu a crítica.



O poeta é escravo e senhor do poema.



Só pelos místicos, pelos músicos e pelos poetas se poderá restaurar a melodia da estrutura humana.



Uma flor é simples entretanto resulta de operações complexas. Uma flor é uma aparição poética.



Do livro O Discípulo de Emaús.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

JOÃO CABRAL DE MELO NETO: POEMA




A GIRALDA




Sevilha de noite: a Giralda,

iluminada, dá a lição

de sua elegância fabulosa,

de incorrigível proporção.



Os cristãos tentaram coroá-la

com peristalgias barrocas;

mas sua proporção é tão certa

que quem a contempla não pousa



nem nas verrugas do barroco,

nem nas curvas quase de cólica:

quem a contempla não as vê,

são como pombas provisórias.



quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

MURILO MENDES: POEMA

(Guignard)



FUTURA VISÃO

Apresentam-me o livro da tua vida
Escrito por dentro e por fora:
Sou digno de romper os sete selos.
Logo na primeira página
Paro três anos em êxtase
Diante da tua fotografia.
A lua e o mar adormecem a meus pés.
Tudo o que evoco vai nascendo ao gritar o teu nome
Berenice! Berenice!
E choro muito
Porque não existe ninguém digno de te olhar.

Alguém me segura à beira do abismo,
Contém minha impaciência e me desarma o braço:
Deverei assistir ao que se descreve no livro.
Terás que partir fisicamente e espiritualmente na desgraça,
Beberás o cálice da injúria e das abominações,
Vestida de púrpura serás sentada no trono da solidão.

Eu devoro o livro, que amarga minhas entranhas.
Glorificai-a! Glorificai-a!
Esta é minha súplica de sempre.

O Princípio vem sobre as nuvens em fogo
E clama para mim e para todo o universo:
Tudo será perdoado aos que amaram muito.


Do livro A poesia em Pânico.


sábado, 3 de dezembro de 2011

FERNANDO PESSOA: POEMA

(Ruaz)





RUBAIYAT

O fim do longo, inútil dia ensombra.
A mesma sp’rança que não deu se escombra,
Prolixa... A vida é um mendigo bêbado
Que estende a mão à sua própria sombra.

Dormimos o universo. A extensa massa
Da confusão das cousas nos enlaça,
Sonhos; e a ébria confluência humana
Vazia ecoa-se de raça em raça.

Ao gozo segue a dor, e o gozo a esta.
Ora o vinho bebemos porque é festa,
Ora o vinho bebemos porque há dor,
Mas de um e de outro vinho nada resta.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

DEREK SOARES CASTRO: SONETO






Exéquias d'Aurora

De rendas vestalinas, sendilhadas,
Em diáfanos véus auroreais,
Caídos brandamente, sepulcrais,
Por sobre as alvas mãos frias, finadas...

Por melífluos matizes outonais,
Em contraste co'as sedas, bem bordadas,
Na plenitude dessas vãs caladas,
Passou todo o cortejo cheio d'ais!

No embalo duma marcha langorosa,
A passarada flébil e chorosa
Cantava a mais nostálgica balada;

A abóbada celeste no infinito,
Abriu-se no céu mais puro e bonito,
Levando a minha eterna, sempre amada!